sexta-feira, junho 15, 2007

Um Título Qualquer - Mais um Bocado

- Pensei que tivesse de falar... com este e com aquele... - Digo, tentando disfarçar a minha satisfação e parecer desinteressado.

- Você não é muito perspicaz em perceber sinais indirectos pois não? - Começa com um ataque. Gosto. Vou devolver.

- Bem, não sei se sabe, mas ser perspicaz é isso mesmo, perceber sinais indirectos. Se fossem directos, não estava a ser perspicaz ao os entender, estava simplesmente a ver, ou a ouvir... Faz sentido, ou não? - Respondo, calmamente, com um sorriso malandro.

- Apanhou-me bem! - Devolve, em forma de gracejo. Foda-se porque é que algumas mulheres têm mesmo de ser perfeitas? Não poderia ela ter uns dentes amarelos, algo assim que retirasse alguma magia? O facto é que ao sorrir, adivinho uma boca completamente apetecível, o que apenas me coloca num papel em que não posso estar. Entenda-se, não posso, mas quero... como quero.

- E que tal baixarmos as defesas?

- Que defesas?

- Ok, baixarmos o ataque...

- Mas assim perde a piada toda... - Foda-se. Puta de resposta. Diz isto a meia voz, e nesta frase diz-me tudo o que eu não posso, mais uma vez, mas quero ouvir.

- Verdade.

- E o cigarro?

- Como?

- Não me tinha convidado para fumar um cigarro?

- Sim, tinha. - E dizendo isto abro o maço de tabaco, tirando dois. Um para mim, um para ela. Continuo sem saber seu nome, mas gosto. Quando lhe perguntei respondeu com outra pergunta, numa evasiva completamente subtil. Tanto que só agora me apercebi. Mas também não sabe o meu, portanto estamos com os mesmo dados na mão.

- Só quero pedir-lhe uma coisa... - Diz, com um sorriso que me deixa com medo do que vai dizer.

- Sim?... - Pergunto, a medo, enquanto tento, disfarçadamente, avistar minha mulher, que deve deambular sozinha pelo salão. Peço a deus para que arranje companhia. Que cinismo, meu Deus (outra vez)! Pedir a deus para esconder o meu interessa por outra mulher.

- Vamos chegarmos um pouco para o canto. O meu marido não gosta nada que eu fume. Importa-se? - O medo que senti ao adivinhar a sua pergunta materializou-se ao ouvir isto. Era uma questão simples, mas por mais pequena que fosse a probabilidade de me tentar beijar, eu não o podia fazer, de maneira nenhuma. Não ali.

- De modo algum. - Como? Nem consigo perceber muito bem o que se passou. Estou eu a pensar numa maneira de me escapulir, de inventar algo, como dizer que a minha mulher está a chamar, e os meus lábios mexem-se, sai som. Ajo completamente segundo o meu desejo, adeus racionalidade. Tento, e consigo, manter sempre a minha pose de pessoa interessante, e misteriosa, escondendo dentro de mim todos estes meus conflitos e... medos. O que se passa é que... fascina-me. Caminho em direcção ao local que sugeriu. Não fica mais longe do que uns poucos passos de onde estávamos, mas tem o (in)conveniente de ficarmos quase completamente escondidos. Sinto o peito arder um pouco.

Ela vem atrás de mim. Pede-me o cigarro, que lhe dou. O contraste entre este e seus lábios pintados de vermelho transporta-me para um qualquer filme. Sacode um pouco o cabelo de seus olhos e olha para mim, com seus olhos enormes, pretos e rasgados, pedindo, com o olhar, um isqueiro. Tiro o meu Zippo prateado e estendo-lhe. Em vez de pegar nele... em vez de segurar o cigarro na ponta dos lábios e acender... Segura na minha mão com ambas, e aproxima os lábios. Consigo quase ouvir o barulho do papel queimar.

Afasta-se um pouco, gira o rosto e solta calmamente o fumo que inspirara. Olha para mim e sorri.


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terça-feira, junho 12, 2007

Livro

Amigos vou publicar um livro com as estórias que lêem aqui! :)

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sábado, junho 02, 2007

Um Título Qualquer!!

Não sei bem como começou. Ou porque começou. Bem... Acho que consigo imaginar, supor... Mas fico na dúvida... Foi quando olhei para ela, foi quando falou comigo, foi quando a beijei... Quando foi?
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Sei, suponho, onde foi. Ela apresentava-se, como era costume fazer, imperial. Vestida a rigor, com o seu vestido longo, vermelho, sem costas. Conseguia vislumbrar umas costas alvas, um ou outro sinal para retirar a monotonia, linhas harmoniosas. Segurava uma taça de champanhe, com suas mãos cobertas por umas luvas brancas que acabavam perto do cotovelo, qual donzela do século vinte. Imagino que só lhe faltava um cigarro com boquilha e um pequeno sinal na face. Já eu, aparentemente distraído, circulava pela sala, ora com minha mulher, ora sem ela, ora conversando com este, ora conversando com aquele. O meu olhar pousava de quando em vez em si. Atraía-me aquela imagem, e dava comigo a questionar-me se não teria um qualquer ascendente árabe. Talvez eu próprio quisesse que assim fosse, quanto mais não fosse para explicar o exotismo daquele rasgado olhar.
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Sim, esse olhar. Foi talvez esse mesmo olhar que deu um grande empurrão. Eu falava com um qualquer director, aborrecido, fazendo meu olhar viajar entre os ricos candelabros pendurados do tecto beje trabalhado, rico. Tentava parecer interessado na conversa. Tarefa árdua. Nos raros momentos em que tento olhar para o meu interlocutor, para não o deixar a questionar-se acerca do meu interesse, vejo, por cima do seu ombro, mais uma vez a... donzela. Apenas desta vez, ela olhou de volta. Aquele olhar tomou conta de mim. Desloquei para ela o interesse que eu própria sentia, e senti-me desejado.
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Despacho o... director, e aproximo-me. Na mão, um licor beirão, que me deixava, eu gostava de imaginar, um aroma agradável nos lábios. Cerro um pouco os olhos, cedendo ao instinto da sedução que nos impede a esconder um pouco de nós próprios, e falo. Custa-me chamar-lhe a atenção. Faz-se difícil. Aproximo-me um pouco mais, toco-lhe, suavemente, no cotovelo, e pergunto, cordialmente, quem é. O sorriso que recebo é devastador.
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Fruto desta minha aproximação, consigo sentir o seu aroma... Nuvens? Não quero ser ridículo, as nuvens não têm cheiro. E se tivessem, como poderia eu saber? Num pensamento eventualmente ridículo e adolescente, questiono-me se esse aroma não advinha do facto de eu próprio me sentir um pouco a levitar.
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A conversa flui, e sinto qualquer coisa. Viajo até à pele da minha mulher, e vejo-me, elegante, com um smoking que me assenta perfeitamente, a falar com uma muito mais elegante mulher, e sinto ciúmes. Contudo, não sei porquê, isto apenas me impele a continuar.
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Viajo, de seguida, para a pele da minha... donzela, e sinto desejo. Quero sair dali. Entre graças não fantasticamente conseguidas, surge a sugestão de irmos fumar um cigarro ao terraço. Nega, tem de falar com este, com aquele, com o marido... Como cavalheiro que tento ser, afasto-me. O céu está estrelado, fazendo jus ao mês em que nos encontramos, e está uma temperatura agradável. Saco a cigarreira e tiro um Dunhill.
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Estou quase a acabar o cigarro, preparando-me para, destruindo um pouco mais o mundo, o atirar sob o parapeito da janela, quando ela chega. Sinto uma espécie de vitória. Ela tinha voltado.

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