sexta-feira, agosto 31, 2007

Happy Days [Kind of]

Tudo pronto, prontinho. Hoje acordei, tomei banho por mais de meia hora, pus desodorizante, perfumei-me com o meu melhor perfume, pus creme hidratante, lavei os dentes e vesti-me com o meu melhor fato. Saí, depois de pegar no acessório fundamental, cumprimentei os vizinhos com um rasgado e sincero sorriso e entrei no carro. Deixei-o a lavar nas bombas de gasolina enquanto fui ao barbeiro. O cabelo estava um pouco grande, pedi para cortar, e que me fizesse a barba impecavelmente. Quando acabou, depois de me esfregar o perfumado after-shave, paguei, deixando uma gorjeta que quase duplicava o preço do corte. Fui buscar o carro. Tudo estava no seu melhor, até o dia era um belo dia. O sol não se apresentava tímido, e mostrava a todos a razão pela qual o nosso sistema se chama… sistema solar. Tudo gira à volta dele, assim como a minha VIDA gira à volta dela.

Era de manhã. Todavia, não tinha grande fome. Como pequeno-almoço apenas um sumo de maracujá que, claro, paguei deixando uma gorjeta especial. Tudo seria perfeito neste dia. Esperei uma horita, pois concerteza ela estaria ainda a dormir (não quero incomodar, claro), enquanto me punha a par das notícias, lendo, de perna cruzada o Jornal de Notícias.

Olho para o relógio, onze horas, perfeito. Saio do café, pego no carro e vou, lenta e calmamente, até sua casa. Como ao lado havia uma florista, comprei um grande ramo de rosas, eram as suas preferidas (não são de todas as mulheres?). Abro o portão, entro na sua propriedade e, com o ramo escondido atrás das costas, toco à campainha.

- Muitos bons dias! – Digo, ao ver a sua cara de sono e espanto. Ela abre um pouco os olhos, mais uma vez espantada, como que tentando perceber se estava a sonhar ou era mesmo verdade e eis que, ao se aperceber, solta um grito.

- João, é ele! – Perfeito! Tal como tinha imaginado! Estão os dois em casa! Ela tenta fechar a porta, e quando percebe que não consegue, foge para dentro. Eu, claro, entro, e fecho calmamente a porta por detrás de mim. Ela dizia não sei o quê a esse João. Não percebi pois estava entretido fechando a sua porta à chave, com a chave que ela me dera há algum tempo atrás.

- Mas querida!! Trouxe-te rosas!! – Digo, em voz alta à medida que passeio pela sala. Não sei onde está. Ouço um reboliço no quarto e de lá sai o tal João. “Sim senhor!”, penso, “escolheu bem, o homem é elegante”. E caminha para mim, com uma cara dos diabos.

- Vai-te embora filho da puta! – Filho da puta? Nem o conheço bem e chama-me nomes! É pena… parece que já não há educação.

- Então rapaz, qual é a necessidade de me chamares nomes? – Digo, com um rasgado sorriso – Trouxe flores para ela e tudo! Não sabia as tuas preferidas, senão também levavas qualquer coisita! – Neste momento, conseguindo a difícil tarefa de tornar a sua expressão ainda mais zangada, avança rapidamente para mim. Ui, vai-me bater.

E vai um. Não havia necessidade. Quer dizer, haver, havia, porque estava tudo planeado, mas não queria que fosse assim. Paciência. Num momento, saco do acessório. Ainda vejo a sua expressão, em menos dum segundo, alterar-se de super-zangado para “que caralho é aquilo??”. Isto, claro, antes de lhe enfiar um tiro nos cornos!

Foda-se, a primeira coisa que me corre mal no dia. Devia ter treinado isto. Afinal acertei-lhe no peito! E nem foi no coração. Mas acho que dá. Ele cai no chão, há muito sangue. Continuo a caminhar, passo ao lado dele e digo-lhe, como quem não quer a coisa “Tiveste azar, foste o primeiro que ela viu para foder e agora quem se fodeu foste tu…”. Ela grita que se farta. Também não tinha imaginado esta gritaria toda. Fecha-se no quarto com o telemóvel na mão, aos gritos. Fecha a porta à chave. Preciso de 3 ou 4 pontapés para conseguir abrir aquela porcaria.

- Zé, que estás a fazer?? Não, por favor! – Incrível, é tal e qual os filmes!

- Bem, ó Catarina, eu não queria, mas eu disse-te tantas vezes pá… – Digo, com um tom condescendente – Se não fosses minha… E ainda por cima começaste a fodê-lo enquanto ainda andavas comigo pá…

- Desculpa Zé, desculpa, por favor não faças nada! – Está só de tshirt, sentada no chão, com as mãos à frente da cara. Sim, porque isso é um escudo fantástico! Qual colete à prova de bala, vamos é todos por as mãos à frente da cara que não acontece nada! Que tristeza.

- Mas repara, trouxe-te rosas, nem tudo é mau! – Digo. Desta vez não sorri tanto. Não é por nada… mas era prai a terceira vez que usava a piada das rosas. Parecia mais engraçado quando pensei nisto em casa. Paciência.

- Bem, Catarina, tenho pena… – E ia disparar neste momento, mas o outro caralho aparece a rastejar, a agarrar-me a perna.

- Ouve lá, és mesmo burro! Fazias-te de morto e ainda te safavas pá! Ela já chamou a bófia e tudo! – Por acaso foi um bocado estúpido. Mas ainda andou muito, mais de 5 metros a rastejar e a esvair-se. Estúpido mas persistente. Dou mais um tiro, desta vez mesmo na cabeça, deixo de sentir a força no meu tornozelo. Tento sacudi-lo mas o gajo parece que está colado à minha perna. Tenho mesmo de me baixar para o afastar. Foda-se, não está mesmo nada a correr como imaginei, já me sujou o fato e tudo! Mas assim até é mais giro.

Outra coisa que não planeei, ao me baixar a Catarina sai a correr sala fora. Foi aqui o momento do dia. Eu, que pelos vistos nem sou muito bom nisto de disparar, sem me levantar, acerto-lhe em cheio no meio das costas! Ela cai a meio caminho entre mim e a porta. Quase!

A polícia deve estar a chegar. Levanto-me, pouso a pistola na mesa da sala, e vou ao frigorífico. Só produtos diet, que porcaria. Lá tiro um copito de vinho que estava aberto. Por sinal também não é grande coisa, mas é o que se arranja. Dou uma volta pela casa, observando as tantas alterações que fez desde que me trocou por aquele imbecil, até que me apercebo da chegada da polícia. Sim, são mesmo eles.

Pego na pistola, vou ao quarto de banho e colo-a à parte de baixo do meu queixo. Penteio-me com a outra mão. Troco de mão, não me consigo pentear com a esquerda. Depois de dar um jeito ao cabelo, olho no espelho, sorrio, penso neste meu último dia, e despeço-me.

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terça-feira, agosto 28, 2007

Ilusões

Narrador

Reúno-me todos os dias com alguém. Rio, faço caras tristes, sou empático, sou antipático, sou um pouco de tudo, de acordo com o que acho que devo ser em determinado momento para gostarem um pouco mais de mim, para reunir um pouco mais de admiração. Quando acordo, acordo já com um enorme olho em cima de mim. Observa-me e esmaga-me, lembrando-me constantemente do que fazer, de como ser, para que assim consiga desfrutar a minha existência. Claro que nesta busca tão desesperada de ser feliz, sinto-me constantemente cansado. Desapareço entre os segundos, disperso busco uma identidade entre as palavras que me dizem, a imagem que vejo no espelho e os sorrisos que recebo. Como seria tudo tão mais fácil se tivesse um guião desta miserável existência.

No fundo… até tenho. O feedback que recebo de toda a gente é o meu guião. Poderia ser aquilo em que eu próprio acredito, o que realmente desejo para mim, mas nada disso é verdade. Os princípios, abandonei-os faz muito tempo, quando percebi que a grande maioria deles me estampava um rótulo de moralista na testa. Daí que procure encontrar nos pseudo-princípios das outras pessoas os meus próprios, tentando manter uma certa coerência impossível de alcançar para o observador mais atento.

Não sei como nem porquê surgiu esta insegurança. Acho que sempre fui assim, não sei porquê. E questiono-me, como me questiono. Como conseguem todas as pessoas ser tão infalíveis, ser tão perfeitas, sem sentir o medo esmagador de errar. E o pior… quando erram, erram com graça. Eu, quando erro, nas raras vezes que isso acontece, erro de uma maneira que me faz sentir completamente humilhado, que me faz sentir uma merda e que todo o meu esforço para ser aceite é menos eficaz que construir um castelo de gelo no Algarve…

Observador

Que porreiraço é o Filipe. Sempre na boa, sempre no pico da onda. Não sei como faz para ser assim. Nunca vi o gajo mal, está sempre a curtir, sempre a planear algo, sempre com alguém, sempre disposto a deixar o amigo a sorrir. Deixa-me a pensar em mim próprio. Às vezes chateia-me ser como sou. Quando estou bem, sei que devo estar triste de vez em quando, porque sou humano, e até para dar mais valor a quando estou feliz. Mas quando acontece estar triste, amaldiçoo essa condição, e queria ser como o Filipe, estar sempre bem, sempre sem problemas, e apreciar cada segundo. “Paciência”, penso, não podemos ser todos assim…

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segunda-feira, agosto 27, 2007

Capa do Livro

Lançamento 13 de Outubro, Biblioteca de Vale de Cambra


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